22 de abril de 2012

FETICHES, ENCANTOS E MAGIAS - Parte I
  O LIVRO DE URANTIA – pág. 967 - DOCUMENTO 88


O conceito de um espírito entrando em um objeto inanimado, em um animal ou em um ser humano, é uma crença muito antiga e que mereceu muitas honras, tendo prevalecido desde os primórdios da evolução da religião. A doutrina da possessão por um espírito é nada mais nada menos do que fetichismo. O selvagem não adora necessariamente o fetiche; adora e reverencia muito logicamente o espírito que reside nesse fetiche. A princípio, acreditava-se que o espírito de um fetiche era um fantasma de um homem morto; posteriormente, supunha-se que espíritos mais elevados residiam nos fetiches. E, assim, o culto do fetiche finalmente incorporou todas as idéias primitivas dos fantasmas, das almas, dos espíritos e da possessão demoníaca.

1. A CRENÇA NOS FETICHES O homem primitivo sempre quis transformar todas as coisas extraordinárias em fetiches; e, por isso, o acaso deu origem a muitos deles. Um homem está doente, algo acontece, e ele fica bem. A mesma coisa é verdadeira sobre a reputação de muitos medicamentos e de métodos ocasionais de tratar a doença. Os objetos ligados aos sonhos podiam ser convertidos em fetiches. Vulcões, mas não as montanhas, transformaram-se em fetiches; cometas, mas não estrelas. O homem primitivo considerava as estrelas cadentes e os meteoros como indicativos da chegada na Terra de espíritos visitantes especiais.
Os primeiros fetiches foram pedregulhos com marcas peculiares, e as “pedras sagradas” têm sido, desde então, buscadas pelo homem; um colar de contas chegou a ser uma coleção de pedras sagradas, uma bateria de amuletos. Muitas tribos tinham pedras fetiches, mas poucas sobreviveram, como a Kaaba e a Pedra de Scone.

 O fogo e a água estavam também entre os fetiches primitivos, e a adoração do fogo, junto com a crença na água benta, ainda sobrevive. As árvores fetiches tiveram um desenvolvimento posterior, e, entre algumas tribos, a persistência da adoração da natureza levou à crença em amuletos habitados por alguma espécie de espírito da natureza. Quando as plantas e as frutas tornaram-se fetiches, elas transformaram-se em um tabu, como alimento. A maçã estava entre as primeiras a entrar para essa categoria; nunca foi comida pelos povos do Levante. Se um animal comia carne humana, ele tornava-se um fetiche. Dessa maneira, o cão tornou-se um animal sagrado para os persas. Se o fetiche é um animal e o fantasma reside permanentemente nele, então o fetichismo pode ter conseqüências para a reencarnação. De muitos modos os selvagens invejavam os animais; eles não se sentiam superiores aos animais e freqüentemente levavam os nomes das suas bestas favoritas.

Quando os animais tornavam-se fetiches, seguia-se o tabu de comer a carne do animal fetiche. Os monos e os símios, por causa da sua semelhança com o homem, tornaram-se animais fetiches muito cedo; posteriormente, as cobras, os pássaros e os suínos foram considerados do mesmo modo. Pág. 968 A vaca, em uma certa época, foi um fetiche, o leite sendo tabu, enquanto os seus excrementos eram tidos em alta conta. A serpente foi reverenciada na Palestina, especialmente pelos fenícios, que, junto com os judeus, consideravam-na como sendo porta-voz dos espíritos do mal. Até muitos dos povos modernos acreditam nos poderes de encanto dos répteis.

A serpente foi venerada desde a Arábia, passando pela Índia, até a dança da tribo Moqui dos homens vermelhos. Alguns dias da semana eram fetiches. Durante idades, a sexta-feira tem sido encarada como um dia de má sorte e o número treze como um mau número. Os números de sorte, o três e o sete, vieram de revelações posteriores; o quatro era o número de sorte do homem primitivo e derivava do reconhecimento primitivo dos quatro pontos da bússola. Era considerado de má sorte contar o gado ou outras posses; os antigos sempre se opuseram a fazer os censos, a “numerar o povo”. O homem primitivo não fazia do sexo um fetiche exagerado; a função reprodutora recebia apenas uma quantidade limitada de atenção. O selvagem tinha a mente natural, nem obscena, nem lasciva. A saliva era um fetiche poderoso; os demônios poderiam ser retirados se se cuspisse em uma pessoa. Que um ancião ou um superior cuspisse em alguém era o mais alto cumprimento. Algumas partes do corpo humano eram vistas como fetiches potenciais, particularmente o cabelo e as unhas.

 As longas unhas dos dedos das mãos dos chefes tinham um grande valor, e as aparas delas eram um fetiche poderoso. A crença nos crânios como fetiches é responsável, posteriormente, por grande parte dos caçadores-de-cabeças. O cordão umbilical era um fetiche altamente valorizado; mesmo hoje, ele é visto assim na África. O primeiro brinquedo da humanidade foi um cordão umbilical que se conservou. Ornado de pérolas, como era sempre feito, foi o primeiro colar do homem. Corcundas e crianças aleijadas eram consideradas como fetiches; acreditava-se que os lunáticos eram tocados pela lua. O homem primitivo não podia distinguir entre o gênio e a insanidade; os idiotas ou eram espancados até a morte ou reverenciados como personalidades fetiches. A histeria confirmava cada vez mais a crença popular na bruxaria; os epiléticos eram sacerdotes e curandeiros freqüentemente.

 A embriaguez era considerada como uma forma de possessão espiritual; quando um selvagem fazia uma farra, ele colocava uma folha no seu cabelo com o propósito de retirar de si a responsabilidade pelos seus atos. Os venenos e os tóxicos tornaram-se fetiches; considerava-se que eles eram causa de possessão. Muitos povos encaravam os gênios como personalidades fetiches, possuídas por um espírito sábio. E esses talentosos humanos logo aprenderam a recorrer à fraude e às trapaças para servir aos seus interesses egoístas. Um homem fetiche era considerado como sendo mais do que humano; era divino, e mesmo infalível. E assim é que os chefes, os reis, os sacerdotes, os profetas e os dirigentes de igrejas finalmente acabaram por desfrutar de um grande poder e por exercer uma autoridade sem limites.

2. A EVOLUÇÃO DO FETICHE

Supunha-se haver uma preferência dos fantasmas por residirem em alguns objetos que lhes haviam pertencido quando estavam vivos na carne. Essa crença explica a eficácia de muitas relíquias modernas. Os antigos sempre reverenciavam os ossos dos seus líderes, e os restos do esqueleto de santos e de heróis ainda são considerados com um respeito supersticioso por muitas pessoas. Ainda hoje, as peregrinações são feitas aos túmulos de grandes homens. A crença em relíquias é uma conseqüência do antigo culto dos fetiches. As relíquias, nas religiões modernas, representam uma tentativa de racionalizar o fetiche do selvagem e assim elevá-lo a um lugar de dignidade e respeitabilidade nos sistemas religiosos modernos. É um ato de paganismo acreditar em fetiches e na magia, mas, supostamente, nada de errado há em aceitar relíquias e milagres. Pág. 969 O fogo – a lareira do lar – tornou-se mais ou menos um fetiche, um lugar sagrado.

 Os santuários e os templos a princípio eram lugares fetiches, porque os mortos estavam enterrados ali. A cabana-fetiche dos hebreus foi elevada por Moisés ao nível de abrigar um superfetiche, o conceito então existente da lei de Deus. Os israelitas, porém, nunca abandonaram a crença peculiar dos cananeus no altar de pedra: “E esta pedra que eu estabeleci como um pilar será a casa de Deus”. Eles acreditavam verdadeiramente que o espírito do seu Deus residia em tais altares de pedra, que eram fetiches, na realidade. As primeiras imagens foram feitas para preservar a aparência e a memória dos mortos ilustres; na realidade, eram monumentos. Os ídolos foram um refinamento do fetichismo. Os primitivos acreditavam que uma cerimônia de consagração conduzia o espírito a entrar na imagem; do mesmo modo, quando certos objetos eram abençoados, eles se transformavam em amuletos. Moisés, quando agregou o segundo mandamento ao antigo código moral da Dalamátia, fez um esforço para controlar a adoração dos fetiches entre os hebreus. Ele indicou cuidadosamente que eles não fizessem espécie alguma de imagem que pudesse ser consagrada como um fetiche. Ele deixou claro: “Não fareis nenhuma imagem gravada ou nenhuma semelhança de qualquer coisa que está no céu acima, nem na terra abaixo, ou nas águas da Terra”. Se bem que esse mandamento haja feito muito para atrasar a arte entre os judeus, ele diminuiu o culto dos fetiches.

 Moisés, contudo, era sábio demais para tentar desalojar subitamente os antigos fetiches, e, portanto, consentiu que se deixassem certas relíquias, dentro da lei, no altar híbrido de guerra e de templo religioso, que era a arca. As palavras finalmente tornaram-se fetiches, mais especialmente aquelas que eram consideradas como sendo palavras de Deus; e desse modo os livros sagrados de muitas religiões tornaram-se prisões fetichistas a encarcerar a imaginação espiritual do homem. Os próprios esforços de Moisés contra os fetiches tornaram-se um fetiche supremo; os seus mandamentos, mais tarde, foram usados para estultificar a arte e para retardar o prazer e a adoração do belo. Nos tempos antigos, a palavra fetiche da autoridade era uma doutrina inspiradora de medo, a mais terrível de todas as tiranias que escravizam os homens. Um fetiche doutrinário conduzirá o homem mortal a trair a si próprio, caindo nas garras da beatice, do fanatismo, da superstição, da intolerância e nas mais atrozes das crueldades bárbaras. O respeito moderno pela sabedoria e pela verdade não é senão uma fuga mais recente à tendência elaboradora de fetiches, levada aos níveis mais altos do pensar e do raciocinar.

 Quanto aos escritos fetiches acumulados, os quais tantos religiosos têm como livros sagrados, não se acredita apenas que o que está no livro seja verdade, mas também que toda a verdade esteja contida no livro. Se um desses livros sagrados por acaso fala da Terra como sendo plana, então, durante várias gerações, os homens e as mulheres sensatos recusarão a aceitar as evidências positivas de que o planeta é redondo. A prática de abrir um desses livros sagrados e deixar que os olhos caiam sobre uma passagem que, se colocada em prática, pode determinar importantes decisões de vida ou de projetos, nada mais é do que um completo fetichismo. Fazer um juramento sobre um “livro sagrado”, ou jurar por algum objeto de veneração suprema, é uma forma de fetichismo refinado. Todavia, de fato, foi um progresso evolucionário real avançar do temor fetichista das lascas de unhas do cacique selvagem, para a adoração de uma esplêndida coleção de cartas, de leis, de lendas, de alegorias, de mitos, de poemas e de crônicas, que refletem afinal a detalhada sabedoria moral de muitos séculos antes do momento e do evento da sua reunião como um “livro sagrado”. Pág. 970 Para transformar-se em fetiches, as palavras tinham de ser consideradas inspiradas, e a invocação de escritos supostamente de inspiração divina levou diretamente ao estabelecimento da autoridade da igreja, enquanto a evolução de formas civis levou ao desabrochamento da autoridade do estado.

[Apresentado por um Brilhante Estrela Vespertino de Nébadon.]

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